O que os espíritas precisam saber X

18 de Abril de 2025 Não Por Sergio França Martins

No dia 24 de fevereiro de 2024, fizemos a primeira publicação de três, baseada no livro O Legado de Allan Kardec da autora Simoni Privato Goidanich lançado, primeiramente em espanhol, no dia 03 de outubro de 2017, em Buenos Aires.
A Confederacion Espiritista Argentina publicou, também em 2017, a tradução para o espanhol do conteúdo definitivo de La Genèse, les miracles et les prédictions selon le spiritisme. Essa tradução que está amplamente difundida nos países de língua espanhola tem por objetivo desfazer o erro histórico que tem levado tantas gerações, desde o século XIX, a lerem e difundirem em vários países — como se fosse definitivo — o conteúdo adulterado de La Genèse, les miracles et les prédictions selon le spiritisme, sem que jamais tenham tido conhecimento do texto original que Allan Kardec publicou nessa obra.
No Brasil, já foi publicada A Gênese os milagres e as predições segundo o Espiritismo — edição conforme o texto original de Allan Kardec da 1ª edição de 1868 pela Fundação Espírita André Luiz (Feal) já na quarta edição — Outubro de 2019.
Assim, seguindo-se às publicações de O Legado de Allan Kardec I, II e III, a série intitulada O que os espíritas precisam saber X.
A mensagem de Emmanuel, por Chico Xavier
Em 20 de setembro de 1928, Canuto procurou seu amigo Chico Xavier em Pedro Leopoldo, para quem já havia confidenciado todas as terríveis histórias sobre o desvio da obra de Allan Kardec após 1869, apesar do esforço da viúva e dos pioneiros para resgatá-la. Depois de horas de conversa na madrugada, Chico, depois de se preparar psiquicamente, psicografou uma mensagem de Emmanuel, que orientava: “Lembremo-nos que, logo depois da partida do Codificador Allan Kardec, envolveu-se o mundo em sombras densas. Desde de 1870, a humanidade quase não conheceu, na governança política dos povos, senão a guerra por estado natural”. E então o Espírito explicou: “Não admita, pois, meu amigo, que as colunas históricas dos alicerces espíritas tenham vindo parar em suas mãos sem a sanção dos Excelsos Desígnios”.
Diante dessas palavras, Canuto comentou: “O guia espiritual consultado refere-se aos manuscritos históricos de Allan Kardec, em meu poder. Sou dos que admitem sinceramente a impossibilidade do acaso em certos eventos de repercussão geral. A história constitui-se de fatos que são efeitos inteligentes. Tem, portanto, causas inteligentes. Os documentos em meu arquivo foram escritos pelo punho de um missionário invulgar, incumbido de lançar os primeiros tijolos da Revelação Espírita. Não foram destruídos por ele; ao contrário, guardados para servir de base à história do Espiritismo. Escaparam às destruições tendenciosas dos inimigos conscientes e inconscientes da Doutrina Espírita. Atravessaram crises e sucessões. Os invasores alemães procuraram em todos os arquivos espíritas os vestígios do Missionário para destruir como um comando sanitário invade os pontos onde supõe estarem os focos de insalubridade pública. Os papéis estavam, porém, guardados num lugar imperceptível de qualquer suspeita, sob o zelo de um homem que talvez não tivesse, pelo seu encargo, a consciência exata do tesouro que guardava. Acham-se agora comigo, em sua maior reserva, desde alguns anos. Porém, sabem de seu valor intrínseco. Mas, aproximando-se o fim de meus dias terrenos, recorri a duas fontes conselheiras, uma das quais em Pedro Leopoldo, Minas”.
Continua Emmanuel em sua recomendação: “Vinculado ao Apóstolo da Codificação, conserve amorosamente o Legado, com preocupação de preservá-lo e distribuí-lo, defendendo-lhe a integridade e dosando-lhe a  administração ao espírito popular, à feição de um membro da família humana, responsável por sagrado depósito dos ancestrais, com o dever de transmiti-lo, com carinho aos descendentes”.
E Canuto ponderou, diante dessas palavras: “Sim, sem qualquer vaidade, e reconhecendo minha posição inferior de servo dos grandes servidores da Revelação Espírita, estou vinculado ao Apóstolo da Codificação, vínculo frágil, é certo, pois é o de um contrato de serviço, perfeitamente rescindível e de curto prazo. Recebi um mandato. Alias, ignoro o porquê de tanta coisa que me coube nesta vida obscura, malgrado minha timidez e aversão pelas responsabilidades”. https://espirito.org.br/autonomia/psicografia-emmanuel/ Trecho da mensagem de 16 páginas do Espírito de Emmanuel psicografada por Chico Xavier, destinada a Canuto Abreu
“Não estamos”, prossegue Emmanuel, “credenciados a indicar-lhe, por enquanto, outros abrigos para a sua sublime herança, que não seja o seu coração de discípulo fiel, porque o Mundo ainda conhecerá vasto incêndio de paixão e de fervor, necessários à purificação dos nossos caminhos. a hora ainda é de aflitiva Tormenta, e, quando a tempestade desarticula os horizontes, a nossa vigilância no leme deve aguardar as determinações do Comando Divino que opera nos recessos da natureza.”
E Canuto confidência, em suas cogitações: “Meu coração, aí, é meu sentimento de responsabilidade de fiel discípulo de Kardec. Emmanuel apela para esse fiel coração, por enquanto, ainda bem que se trata de um abrigo provisório, dada a curta passada que me resta para o túmulo. Admito que o mundo deverá queimar seus ideais egoísticos, antes de entrar no caminho nosso que o Espiritismo vem rasgando na selva a que se refere Dante. Partirei antes. Como entender o dever de guardar a ‘sublime herança’ em minha fidelidade de discípulo, senão, por enquanto, como adverte o Guia?”.
O pesquisador já imaginava que a divulgação só ocorreria depois de sua morte, pois partiria antes.
E, então, Canuto recebe das mãos de Chico Xavier o seguinte conselho de Emmanuel: “Assim sendo, somos de parecer que imponha a si mesmo, com a proteção do Senhor, a disciplina necessária, oferecendo, se possível, duas horas por dia ao trabalho de tradução paciente e cópia leal dos documentos, a partir por ordem cronológica de sua produção – por ano de serviço -, organizando as atividades preciosas com a cooperação profissional de alguém que não possa lanhar os escritos em vibrações de sensacionalismo e cupidez, a fim de que o futuro encontre o documentário habilitado a produzir os seus frutos, incluindo não apenas o trabalho apostólico de Allan Kardec, mas também o esforço dos pioneiros”.
Centenas de manuscritos, alguns com letras pequenas, difíceis de ler a olho nu, receberam a dedicação diária de Canuto Abreu por décadas. Mas não era só esse o seu mandato diante da Doutrina. Continua o Espírito:
“Quinzenalmente, se possível, receberá auxílio para escrever suas próprias impressões, em forma de notas, apontamentos, observações ou crônicas do movimento espírita em seus primórdios, que publicará ou não, mas que se articularão por tijolos de luz, endereçados às edificações do Porvir”.
E Canuto completa com seus pensamentos, afirmando: “A inspiração é dote de todo homem chamado ao serviço da verdade. As minhas impressões, subordinadas  à inspiração, equivalerão a simples comunicação mediúnica do tipo consciente. Provavelmente a crônica daí resultante será mais documentada do que aquela que escrevi em 1922”.
Realmente, as centenas de caixas que chegaram ao CDOR – FEAL, as dezenas de milhares de documentos manuscritos e datilografados por Canuto, testemunham o quanto o fiel pesquisador serviu à causa da Doutrina Espírita, elaborando a maior e mais bem documentada história do Espiritismo, tratando do antes, durante e depois das atividades de Allan Kardec. Um patrimônio de valor inestimável que só agora começa a vir a público, permitindo que sua missão enfim se cumpra.
Por fim, prevendo as dificuldades que seriam enfrentadas pelo pesquisador espírita na execução de tão grande missão sem poder ser auxiliado por ninguém, trabalhando incansavelmente sozinho e sabendo que em vida nada poderia se tornar público, deveria agir com o mais absoluto desprendimento do resultado de suas valiosas pesquisas e dos documentos raros, Emmanuel recomenda: “Quanto à solidão e à incompreensão, recordemos a tempestade. Quando a procela risca o firmamento, raros homens meditam no amanhã. É preciso compreender”, conclui o Espírito, “e atender, servir e passar”.
Resoluto, Canuto aponta sua última consideração: “Sim, felizmente, compreendo. Venho esperando, desejo servir e passar. O trabalho só começou hoje. Aqui ficam as primeiras linhas. Possa eu merecer a paz, saúde e alegria, indispensável para me tornar verdadeiramente útil nesse modestíssimo empreendimento!”.
Entre os guardados de Canuto Abreu presentes em seu acevo, nos deparamos com diversas trocas de cartas entre ele e Chico Xavier, demonstrando respeito, amizade e confiança mútuos.
Numa cópia de missiva enviada por Canuto ao médium, de São Paulo, no dia 7 de outubro de 1958, em meio aos avisos e relatos, uma importante resolução é comunicada:

Não devo roubar-lhe o tempo, eis que é o único e mais estimável patrimônio do amigo. Dir-lhe-ei apenas que tomei na melhor conta o conselho relativo ao destino, ou melhor, destinação para o arquivo confiado a mim. Desde os quinze anos eu me consagro ao Espiritismo, ao qual dou as melhores horas da minha vida. Há, portanto, meio século. E que fiz eu, até hoje, de útil a meu semelhante? Para não exagerar, apenas o óbolo do homem que passa pela multidão. Todos os projetos jazem em seus túmulos pelas minhas gavetas de papéis velhos amarelecidos pelo tempo. Às vezes, impotente para aproveitar as ideias postas nas folhas envelhecidas, tenho saudades do Futuro…

O futuro é agora. O acervo vai se tornar público. Momento tão aguardado por Canuto e Chico Xavier, para reavivar os trabalhos da Doutrina. Hora esperada por Allan Kardec, quando os comentadores poderão estabelecer a história do Espiritismo não por lendas falsas, mas julgando “os homens e as coisas sobre peças autênticas”, em suas palavras.
Numa caixa pessoal de Canuto Abreu, dentro de uma pasta de papel pardo, encontramos preciosidades selecionadas, como uma fotografia autografada para ele por Léon Denis, uma carta manuscrita de Camille Flammarion, outra de Gabriel Delanne, notas pessoais de próprio punho de Allan Kardec e, por fim, uma psicografia à caneta, sem referência do médium:

Meu querido amigo
Você é como Francisco que pediu ao Pai para amar mais do que fosse amado; para dar mais do que recebesse, para consolar mais do que fosse consolado.
A luz realmente não é para ser colocada sob o alqueire, mas sim no alto das casas ou dos montes para servir de guia aos caminhantes. https://espirito.org.br/autonomia/imagem-leon-denis/ Cartão fotográfico com dedicatória de Léon Denis a Canuto de Abreu
Os essênios guardavam em cavernas seguras os pergaminhos que ensinavam aos que viessem depois deles as verdades que lhes haviam sido confiadas e que ainda não estava na hora de ser divulgadas.
Moisés em sua jornada pela Terra banhou sua alma nestas verdades que seus guardiões lhes puseram em mãos no momento oportuno.
Jesus também.
Que todos os guardiões do presente possam também guardar em lugar seguro o tesouro que lhes foi entregue.
Para isto, é necessário orar e vigiar.
Se orar somente e não vigiar ao mesmo tempo, e fiado na oração adormecer no seu posto, os ladrões poderão chegar e levar o tesouro.
E o clamor da multidão que reclama a posse do tesouro com seu legítimo dono é enlouquecedor.
Vigiai o tesouro que o Pai lhe entregou para que no momento oportuno ele seja entregue ao seu legítimo dono.
Unidos em Deus caminhamos como irmãos continuando nossa jornada, buscando calor no seu coração quando sentimos o frio do sofrimento de nossos irmãos e levando meu amigo, a seu coração fatigado pela larga e árdua caminhada neste abençoado corpo, o nosso calor fraterno em nosso Senhor Jesus Cristo.
O velho Bezerra, 14 de novembro de 1968

Psicografia Bezerra a Canuto

As páginas amareladas dessa mensagem profetizaram que não caberia a Canuto Abreu tornar seu acervo público ainda em vida. Agora, finalmente, escapou esse tesouro de ser levado por “ladrões”, como diz Bezerra Espírito, e está agora entregue ao seu legítimo dono, que é a humanidade. Pois, o legado de Allan Kardec é um patrimônio da humanidade, luz do futuro iluminando o caminho para sempre.
E, olhando para a data da psicografia de Bezerra de Menezes, nos demos conta de que foi encontrada justamente no dia 14 de novembro de 2018. Exatos cinquenta anos depois.
Referência:
1- Autonomia: a história jamais contada do Espiritismo/Paulo Henrique de Figueiredo – São Paulo(SP): Fundação Espírita André Luiz, 2019.